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O Imposto Seletivo na Reforma Tributária Brasileira (LC 214/2025)

 


Função, origem, estrutura, produtos atingidos e impactos para o comércio e o consumidor

1. Introdução

O Imposto Seletivo (IS) é um dos três pilares da nova tributação sobre o consumo no Brasil, introduzido pela Lei Complementar nº 214, de 16 de janeiro de 2025, que regulamenta a Emenda Constitucional nº 132/2023.

Essa lei complementa a estrutura da CBS (Contribuição sobre Bens e Serviços) e do IBS (Imposto sobre Bens e Serviços) — tributos que substituirão, gradualmente, PIS, Cofins, ICMS, ISS e parte do IPI — e cria o IS (Imposto Seletivo) como um tributo federal, monofásico e extrafiscal, voltado à tributação de bens e serviços prejudiciais à saúde humana ou ao meio ambiente.

A inspiração vem de modelos internacionais conhecidos como “sin taxes” (impostos do pecado) ou excise taxes, aplicados em países como Reino Unido, Canadá e Chile, voltados à regulação de comportamentos de consumo e à mitigação de impactos negativos de certos produtos.

2. Origem e contexto da proposta

2.1. Da PEC 45/2019 à Emenda Constitucional 132/2023

A primeira formulação do Imposto Seletivo surgiu nos estudos do Centro de Cidadania Fiscal (CCiF), coordenado pelo economista Bernard Appy, e foi incorporada à Proposta de Emenda Constitucional 45/2019.

O texto previa a substituição de tributos sobre consumo por um IVA dual (IBS/CBS) e a criação de um imposto federal seletivo para produtos nocivos — uma resposta à necessidade de manter um instrumento regulatório após a extinção do IPI.

A ideia foi acolhida na EC 132/2023, que incluiu o inciso VIII no art. 153 da Constituição Federal, autorizando a União a instituir “imposto sobre a produção, extração, comercialização ou importação de bens e serviços prejudiciais à saúde ou ao meio ambiente”.

2.2. Consolidação na LC 214/2025

O Projeto de Lei Complementar 68/2024, elaborado pelo Ministério da Fazenda e debatido com o Congresso, resultou na Lei Complementar 214/2025, que define o Imposto Seletivo nos artigos 409 a 411 e no Anexo XVII.

Esse anexo lista expressamente os bens e serviços sujeitos à incidência, com base em critérios de nocividade comprovada e impacto ambiental relevante.

ANEXO XVII

BENS E SERVIÇOS SUJEITOS AO IMPOSTO SELETIVO

Veículos

87.03; 8704.21 (exceto os caminhões); 8704.31 (exceto os caminhões); 8704.41.00 (exceto os caminhões); 8704.51.00 (exceto os caminhões); 8704.60.00 (exceto os caminhões); 8704.90.00 (exceto os caminhões); ressalvados os veículos com características técnicas específicas para uso operacional das Forças Armadas ou dos órgãos de Segurança Pública

Aeronaves e Embarcações

8802, exceto o código 8802.60.00; e embarcações com motor classificadas na posição 8903; ressalvadas as aeronaves e embarcações com características técnicas específicas para uso operacional das Forças Armadas ou dos órgãos de Segurança Pública

Produtos fumígenos

2401; 2402; 2403; 2404

Bebidas alcóolicas

2203; 2204; 2205; 2206; 2208

Bebidas açucaradas

2202.10.00

Bens minerais

2601; 2709.00.10; 2711.11.00; 2711.21.00

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3. Natureza e características jurídicas

Aspecto

Descrição

Competência

União Federal

Base legal

EC 132/2023 e LC 214/2025 (arts. 409–411)

Incidência

Produção, extração, comercialização ou importação de bens e serviços nocivos

Natureza

Extrafiscal (função regulatória, não arrecadatória)

Cobrança

Monofásica — uma única etapa da cadeia

Créditos

Vedado o aproveitamento de créditos de CBS ou IBS sobre o valor do IS

Finalidade

Desestimular consumo e produção de bens prejudiciais à saúde ou ao ambiente; internalizar custos sociais/ambientais

Início previsto

Gradualmente a partir de 2027, junto com a transição do novo sistema de consumo

Bernard Appy, Secretário Extraordinário da Reforma Tributária, sintetizou a lógica do imposto:

“Não tem por que a União usar esse tributo para fins arrecadatórios, não faz sentido. É um tributo que será utilizado com caráter regulatório. As pessoas estão achando que vamos usar para fins arrecadatórios, mas não vamos” (Fonte: entrevista a O Dia, jul. 2023).

 

4. Produtos e serviços sujeitos ao Imposto Seletivo

De acordo com o Anexo XVII da LC 214/2025, os grupos de bens e serviços atingidos são:

4.1. Bens e serviços listados na lei

Categoria

Exemplos / códigos NCM conforme o Anexo XVII

Veículos automotores

NCM 8703, 8704.21, 8704.31, 8704.41.00, 8704.51.00, 8704.60.00, 8704.90.00 — exceto caminhões

Aeronaves e embarcações

Aeronaves (NCM 8802, exceto 8802.60.00); Embarcações de recreio (NCM 8903)

Produtos fumígenos (tabaco e derivados)

NCM 2401 a 2404 — cigarros, fumo para enrolar, charutos, dispositivos aquecidos

Bebidas alcoólicas

NCM 2203 a 2208 — cervejas, destilados, vinhos, sidras, RTDs

Bebidas açucaradas / refrigerantes

NCM 2202.10.00 — refrigerantes, energéticos, chás prontos, isotônicos

Bens minerais e derivados da extração

NCM 2601; 2709.00.10; 2711.11.00; 2711.21.00 — minérios e combustíveis fósseis

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(Fonte: Anexo XVII da Lei Complementar 214/2025)

4.2. Critérios adicionais

A lei permite que atos regulamentares da Receita Federal e do Ministério da Fazenda detalhem:

  • Subposições e exceções adicionais (por exemplo, faixas de teor alcoólico ou de açúcar);
  • Critérios técnicos (emissões de CO₂, poluição sonora, impacto ambiental);
  • Situações de exclusão (uso militar, segurança pública, transporte coletivo essencial).

5. Função extrafiscal e alinhamento internacional

O Imposto Seletivo segue a tendência global de tributação voltada à modificação de comportamentos de consumo.

Países como Reino Unido, Chile e México adotaram tributos sobre bebidas açucaradas, e a União Europeia aplica excise duties sobre tabaco, álcool e combustíveis há décadas.

No Brasil, a Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS) e o Ministério da Saúde defendem esse tipo de tributação como instrumento de saúde pública, ao reduzir o consumo de produtos ultra processados, bebidas alcoólicas e tabaco.

6. Impactos econômicos e sociais

6.1. Para o consumidor

  • O impacto direto será sentido em produtos de consumo popular, como refrigerantes, bebidas alcoólicas e cigarros.
  • A tributação monofásica tende a elevar o preço final, com repasse integral ou parcial ao consumidor.
  • A intenção declarada do governo é desestimular o consumo e internalizar custos sociais (saúde pública, poluição, doenças crônicas).

6.2. Para o comércio varejista

  • O varejo será impactado indiretamente, via aumento de preços dos itens sujeitos ao IS.
  • O repasse logístico e o ajuste de margens exigirão atenção de supermercados, atacarejos e lojas de conveniência.
  • Produtos de grande giro, como bebidas e cigarros, terão impacto direto nas estratégias de precificação e promoções.
  • O varejo deve adaptar sistemas de ERP e relatórios fiscais para identificar os itens com incidência do IS, uma vez que não há direito a crédito (ou seja, o imposto não é recuperável).

6.3. Para a indústria e importadores

  • O IS incidirá na produção ou na importação, concentrando a arrecadação nas empresas industriais e importadoras.
  • Isso simplifica a fiscalização, mas exige revisão de cadeias de fornecimento e ajuste de precificação em setores como bebidas, fumo, automotivo e mineração.

7. Relação com outros tributos

Tributo

Situação após a reforma

IPI

Extinto para a maioria dos produtos; o IS assume parte de sua função regulatória

PIS/Cofins e ICMS/ISS

Substituídos gradualmente pela CBS e IBS

Imposto de Importação e IOF

Mantidos, com coexistência pontual


O Imposto Seletivo não gera créditos para CBS ou IBS, reforçando seu caráter autônomo e regulatório.



8. Transparência e controle social

A LC 214/2025 determina que a aplicação do IS deverá observar:

  • Publicação anual das receitas arrecadadas e da destinação dos recursos;
  • Revisões periódicas de impacto sobre saúde e meio ambiente;
  • Audiências públicas e consultas para inclusão ou exclusão de produtos.

Essas medidas visam legitimar o caráter extrafiscal do tributo e evitar seu uso como mera fonte de arrecadação.

9. Perspectivas e próximos passos

A regulamentação final do Imposto Seletivo deverá ocorrer entre 2025 e 2026, antes do início da fase operacional da reforma (2027).

O Ministério da Fazenda e a Receita Federal publicarão decretos e portarias definindo:

  • Alíquotas específicas;
  • Fórmulas de cálculo (ex.: R$/litro, R$/kg ou percentual sobre preço);
  • Procedimentos de recolhimento, escrituração e fiscalização.

A tendência é que o IS seja utilizado com parcimônia, evitando aumento geral de carga tributária e priorizando a regulação de bens com comprovado impacto negativo.

10. Conclusão

O Imposto Seletivo, previsto na LC 214/2025, representa um novo instrumento de política pública no sistema tributário brasileiro.

Mais do que arrecadar, o IS busca corrigir externalidades negativas e estimular comportamentos sustentáveis.

Para o comércio varejista, os impactos serão indiretos, porém relevantes — especialmente na precificação e na demanda de itens sensíveis (bebidas, cigarros, automóveis).

A compreensão e o monitoramento desse tributo serão essenciais para a adaptação de empresas, consumidores e governos à nova era tributária que se inicia com a Reforma.

Referências principais


CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL DE 1988
https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm

EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 132, DE 20 DE DEZEMBRO DE 2023
https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/emendas/emc/emc132.htm

Imposto Seletivo: quais setores serão afetados na reforma tributária?
https://www.senior.com.br/blog/imposto-seletivo-reforma-tributaria?

Imposto Seletivo na Reforma Tributária: bebidas, cigarros e mais produtos
https://www.taxgroup.com.br/intelligence/imposto-seletivo-na-reforma-tributaria-saiba-os-principais-pontos/

“Imposto do pecado” (Imposto seletivo): o que é, quando começa e lista de produtos
https://www.contabilizei.com.br/contabilidade-online/imposto-do-pecado-imposto-seletivo-o-que-e-quando-comeca-e-lista-de-produtos/

LEI COMPLEMENTAR Nº 214, DE 16 DE JANEIRO DE 2025
https://www.planalto.gov.br/CCIVIL_03/LEIS/LCP/Lcp214.htm#anexo17

LEI COMPLEMENTAR Nº 214, DE 16 DE JANEIRO DE 2025
O que é a Lei Complementar 214: o marco legal da nova Reforma Tributária
https://sovos.com/pt-br/blog/tributos/o-que-e-a-lei-complementar-214/

O imposto seletivo na reforma tributária: A proposta de Emenda Constitucional Nº. 45, DE 2019
https://periodicos.ufpe.br/revistas/index.php/ACADEMICA/article/view/260028

Reforma tributária sobre o consumo e seus efeitos regressivos no contexto de justiça social
https://revistajrg.com/index.php/jrg/article/download/1497/1241/6781

Nota de rodapé:

Este artigo foi desenvolvido com o apoio de ferramentas de Inteligência Artificial, incluindo sistemas de processamento de linguagem natural e geração de conteúdo técnico, com revisão humana para garantir precisão e clareza.

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