Base da análise: Live “Reforma Tributária do Consumo e o Setor de Panificação” – 5º Congresso FIPAN, apresentada por Mário Sérgio Carraro Telles (a seguir).
Introdução
A Reforma Tributária é um dos temas mais debatidos no Brasil atualmente, dada sua abrangência e impacto direto sobre diversos setores da economia. Um dos segmentos mais afetados é o setor de panificação e confeitaria, que é majoritariamente composto por pequenas empresas.
Durante o 5º Congresso FIPAN, Mário Sérgio Carraro Telles apresentou uma análise detalhada sobre como as mudanças na tributação do consumo — e não da renda ou folha de pagamento — afetarão empresas de diferentes portes e perfis de atuação. Esta análise visa detalhar esses impactos, validando tecnicamente os pontos abordados na live.
1. Escopo da Reforma Tributária do Consumo
1.1 Tributos substituídos e novos impostos
A reforma trata exclusivamente da tributação do consumo, mantendo inalterados:
- Imposto de Renda (pessoa física e jurídica)
- Contribuições sobre a folha de pagamento
As mudanças centram-se na substituição de tributos federais e subnacionais existentes:
|
Tributos
atuais |
Tributos
substitutos |
|
PIS, Cofins, IOF Seguros |
CBS (Contribuição sobre Bens e
Serviços) – IVA federal |
|
ICMS, ISS |
IBS (Imposto sobre Bens e
Serviços) – IVA subnacional |
Além disso, o Imposto Seletivo substitui parte do IPI, incidindo apenas sobre produtos cujo consumo se deseja desestimular, como bebidas alcoólicas, bebidas açucaradas e cigarros.
Validação técnica: A criação do IVA dual (CBS federal e IBS subnacional) centraliza e uniformiza a tributação do consumo, mantendo neutralidade fiscal prevista na Constituição quanto à carga tributária agregada.
1.2 Cronograma de transição
A transição ocorrerá ao longo de oito anos para os contribuintes, enquanto a distribuição entre estados e municípios terá um período mais longo (até 50 anos) para minimizar impactos sobre receitas subnacionais.
- 2026: Período de teste, alíquotas iniciais de 1% (CBS e IBS) — provavelmente não exigirão recolhimento imediato.
- 2027: Entrada em vigor da CBS com alíquota estimada de 9%; IBS continua em 0,1%. O Imposto Seletivo substitui parcialmente o IPI.
- 2029–2032: Redução gradual de ICMS e ISS; aumento progressivo do IBS até 19%.
- 2033: Sistema atual extinto; IBS e CBS plenamente vigentes.
Validação técnica: A transição gradual é essencial para evitar desequilíbrios entre arrecadação federal e subnacional.
2. Estrutura e características dos novos tributos
2.1 Base ampla e crédito integral
- Os tributos CBS e IBS terão base ampla, incidindo sobre toda a economia, eliminando disputas de competência entre ICMS e ISS (como no caso de serviços gráficos).
- Empresas fora do Simples poderão se apropriar de crédito integral sobre insumos, serviços e bens de capital, reduzindo custo efetivo de tributação.
- Pequenos insumos de consumo pessoal (ex.: vinho ou cigarro em uso não comercial) não geram crédito.
2.2 Alíquotas uniformes e simplificação do cálculo
- Alíquota padrão estimada em 28%, com exceções para determinados setores (alimentação, bens imóveis, serviços financeiros).
- Diferentemente do ICMS atual em alguns estados, onde o cálculo é “por dentro” (incidência sobre preço com imposto), o novo sistema será “por fora”: 29% sobre o valor do produto → preço final = produto + imposto.
2.3 Split Payment
- Implementação de recolhimento direto do imposto via sistema financeiro (split payment), garantindo que o imposto vá diretamente à Receita Federal e ao Comitê Gestor para IBS.
- Possibilidade de split manual quando a operação não passar pelo sistema financeiro, mantendo direito ao crédito.
Validação técnica: O split payment aumenta a transparência, reduz inadimplência e garante crédito fiscal apenas sobre impostos efetivamente pagos.
3. Incentivos e regimes especiais
- Alíquota zero: produtos essenciais (ex.: pão francês, massa de pão).
- Redução de 60%: alimentos da cesta básica e produtos relevantes para panificação.
- Bens imóveis: redução de 70% para locação comercial.
- Compras governamentais: impostos pagos são totalmente devolvidos ao fornecedor.
- Cashback: devolução de 20% do imposto para consumidores de baixa renda em produtos específicos.
- Simples Nacional: empresas podem optar por permanecer no regime simplificado ou migrar para débito e crédito (aproveitando créditos).
Validação técnica: Esses regimes e benefícios preservam incentivos sociais e competitivos, especialmente para pequenas empresas e consumidores de baixa renda.
4. Impactos práticos no setor de panificação
4.1 Perfil do setor
- 98% das empresas são do Simples Nacional; mais da metade da receita do setor é originada dessas empresas.
- Distribuição por segmento: 85% vendem para o consumidor final (permanecem no Simples), 15% atuam na cadeia B2B (optam por débito e crédito).
4.2 Fim da Substituição Tributária (ST)
- Antes da reforma: ST gera tributação cumulativa elevada, com antecipação de ICMS sobre produtos industrializados.
- Exemplo: bombom com ST → tributação total 22% na cadeia.
- Após reforma: tributação via débito e crédito → 21,1%.
Benefícios:
- Redução de carga tributária;
- Simplificação de compliance;
- Menor impacto sobre fluxo de caixa da padaria.
4.3 Comparativo Simples vs Lucro Real
|
Aspecto |
Simples
Nacional |
Lucro
Real |
|
Faturamento |
3,6 milhões/ano (ex.) |
100 milhões/ano (ex.) |
|
Tributação sobre insumos |
R$ 487.378 → reduzido com fim
da ST |
R$ 11 milhões → reduz para 5,7
milhões |
|
Tributação sobre vendas |
R$ 160.539 |
R$ 13 milhões → redução
significativa |
|
Tributação total |
R$ 648.000 |
R$ 18,9 milhões |
Validação técnica: A redução é maior em empresas do Simples devido ao fim da ST, enquanto empresas do Lucro Real aproveitam crédito de insumos e alíquotas reduzidas de produtos essenciais.
5. Pontos críticos e recomendações
- Atenção aos fornecedores: redução do imposto sobre insumos deve refletir nos preços de venda para transferir benefício ao setor.
- Escolha do regime tributário: empresas do Simples devem avaliar custo-benefício entre permanência no regime e migração para débito e crédito.
- Gestão de crédito fiscal: empresas fora do Simples devem organizar fluxo de apuração para não perder direito a créditos.
Conclusão
A Reforma Tributária do Consumo representa uma oportunidade histórica de simplificação e redução da carga tributária no setor de panificação, especialmente para micro e pequenas empresas.
Principais ganhos:
- Fim da Substituição Tributária → simplificação e redução de custo de conformidade;
- Crédito integral sobre insumos → melhora de fluxo de caixa;
- Alíquotas reduzidas ou zeradas para produtos essenciais;
- Split payment → recolhimento eficiente e seguro do imposto.
O impacto total dependerá de decisões de regime tributário, repasse de preços e adesão a benefícios fiscais, mas, de forma geral, o setor tende a se tornar mais competitivo e eficiente.

0 Comentários