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Reforma Tributária - O IVA Chega aos Bancos: A Revolução Tributária dos Serviços Financeiros

 


Introdução

A Reforma Tributária inaugurou uma nova etapa na história fiscal brasileira ao unificar a tributação sobre o consumo por meio do Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) e da Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), formando o chamado IVA dual.
Entre os diversos capítulos da regulamentação, um dos mais complexos e inovadores está nos Regimes Específicos aplicáveis ao setor financeiro, disciplinados nos arts. 181 a 250 da Lei Complementar nº 214/2024.

Esse segmento — que abrange bancos, seguradoras, fundos de investimento, arranjos de pagamento e entidades de infraestrutura de mercado — sempre foi tratado de forma diferenciada em todo o mundo, dada a dificuldade de mensurar valor agregado em atividades de intermediação financeira.
No Brasil, a mudança representa uma ruptura com a lógica cumulativa do PIS e da Cofins, introduzindo pela primeira vez a não cumulatividade plena também para os serviços financeiros.

O diálogo conduzido pela Receita Federal, com a participação de Bernardo Appy, Roni Peterson, Marcos Flores e Robinson Barreirinhas, destacou como o país está desenvolvendo um modelo próprio de IVA financeiro, que equilibra simplicidade operacional, neutralidade concorrencial e coerência federativa.

Este artigo resume os principais pontos dessa discussão e analisa os impactos práticos, legais e tecnológicos dessa transformação para o sistema financeiro e para o ambiente de negócios brasileiro.


O Evento

Título: “Diálogos - Entendendo a Reforma Tributária – Regimes específicos: financeiros (arts. 181 a 250)”

Participantes:

  • Bernardo Appy — Secretário Extraordinário da Reforma Tributária
  • Roni Peterson — Auditor-Fiscal
  • Marcos Flores — Coordenador da Reforma Tributária do Consumo
  • Moderador: Robinson Barreirinhas — Secretário Especial da Receita Federal do Brasil





1. Introdução e fundamentos do regime específico financeiro

Falas principais

“...os serviços financeiros são de fato uma grande inovação na regulamentação da reforma tributária. Na maioria dos países do mundo, os serviços financeiros são isentos... No sistema brasileiro, nós estamos criando um método em que, para uma grande maioria dos serviços financeiros, conseguiremos adotar um sistema não cumulativo...”
(Bernardo Appy)


Contexto normativo

O tema “Regimes Específicos – Setor Financeiro” está disciplinado nos arts. 181 a 250 da Lei Complementar nº 214/2025, que regulamenta a Emenda Constitucional nº 132/2023 (Reforma Tributária do Consumo), que tem como proposição originária o PLP 68/2024.

1.1. O que muda na tributação dos serviços financeiros?

Historicamente, serviços financeiros não eram plenamente tributados pelo IVA (nem pelo PIS/Cofins de forma não cumulativa), pois:

  • O valor agregado de produtos financeiros (empréstimos, seguros, investimentos, cartões etc.) é difícil de mensurar operação a operação;
  • Países como a União Europeia e Canadá isentam ou aplicam zero, sem direito a crédito, o que gera cumulatividade oculta.

A inovação brasileira:

O Brasil está criando um modelo inédito de não cumulatividade parcial, que:

  • Tributa a margem financeira (spread) das instituições;
  • Concede crédito ao tomador (empresa que contrata o serviço), proporcional ao spread implícito em cada parcela de pagamento.
  • Abrange operações como: crédito e arrendamento mercantil, seguros e resseguros, administração de fundos e carteiras, serviços de pagamento, factoring, entre outros contidos no art. 182 da LC 214/2025.


1.2. Substituição do IOF

“Tem uma mudança importante na Constituição, afastando o IOF nessas operações. Ficou agora o IVA, não é isso?”
(Moderador)


(Adendo nosso): Sobre o trecho acima vale a pena esclarecer: 

"O fim do IOF sobre operações financeiras e seguros não consta no cronograma da reforma tributária, porém, já em 2027, terá espectro reduzido.
O art. 23 da EC 132/23 determina que o art. 153, V, passará, a partir de 2027, a contar com a nova redação: "operações de crédito e câmbio ou relativas a títulos ou valores mobiliários", o que, por consequência, significa a exclusão sobre serviços financeiros e seguros.  
A ausência de clareza e disciplina sobre essa transição em curso pode prejudicar o crédito financeiro para os fornecedores e, por consequência, para toda a sociedade."
Portanto, o ponto trazido pelo Moderador pressupõe que haverá norma a qual revogará a incidência do IOF sobre operações de crédito, câmbio e seguro, a partir de 2027, transferindo a competência para o IVA dual (CBS + IBS).

1.3. Não cumulatividade e neutralidade

“...vai na linha da não cumulatividade efetiva e da neutralidade...”

(Barreirinhas e Appy)

 

Esses são dois princípios centrais do novo sistema:

Princípio

Significado prático

Não cumulatividade

Cada etapa da cadeia paga imposto apenas sobre o valor agregado, com direito integral a crédito.

Neutralidade

O tributo não interfere nas decisões empresariais (por exemplo, terceirizar ou internalizar um serviço).


1.4. Desafio operacional: tributação da “margem”

“...no serviço tributado na forma de margem, você não consegue operação a operação vincular o débito com o crédito.”
(Appy)


Isso se refere à complexidade técnica de calcular o crédito do tomador, pois o valor agregado (spread) é implícito nas parcelas financeiras. A tributação dos serviços hoje é feita sobre margens de operação que dificultam operar no sistema de débito e crédito, como se apresenta na não cumulatividade, sendo que o ideal seria tributar operação por operação.

A previsão é de se criar algum instrumento mantendo o crédito a ser calculado com base em parâmetros médios,. Um caminho já foi encontrado (não informado qual seria), mas provavelmente ainda serão definidos por regulamento do Comitê Gestor do IBS e da Receita Federal (para CBS).


2. Regime Específico dos Serviços Financeiros

2.1. Quem está abrangido pelo regime (arts. 182–184 do LC 214/2025)

“...a definição do prestador do serviço financeiro abrangido por esse regime também é feita de maneira ampla... a economia moderna é cada vez mais financeirizada...”
(Moderador e Roni Peterson)

Comentário técnico:

O art. 182 define o escopo das atividades financeiras (crédito, seguros, investimentos, pagamentos etc.), e o art. 183 lista os sujeitos passivos (quem se enquadra no regime):

  • § 1º – Seriam as Instituições supervisionadas pelo Banco Central, CVM ou Susep;
  • § 2º – Seriam outras entidades não supervisionadas, mas que atuem habitualmente e profissionalmente em operações financeiras, como factoring, fintechs e arranjos de pagamento.
  • Inciso VI – Cláusula aberta que abrange qualquer agente que exerça intermediação financeira econômica, mesmo sem regulação específica.

Impacto prático:

O regime não se limita, portanto, aos grandes bancos. Plataformas de pagamento eletrônico, antecipação de recebíveis e crédito privado (ex: fintechs de adquirência usadas por comércios varejistas) também entram.
➡️ Logo, custos financeiros com maquininhas, gateway de pagamento e crédito rotativo empresarial passarão a gerar créditos de IBS/CBS, reduzindo cumulatividade.

2.2 Serviços no regime geral × regime específico (art. 184 do LC 214/2025)

“...tarifas e comissões ligadas à conta corrente ou conta de pagamento ficam no regime geral...”
(Marcos Flores e Barreirinhas)

O Art. 184, LC 214/2025 exclui do regime financeiro os serviços obrigatoriamente prestados por bancos e remunerados por tarifas, mantendo-os no regime geral de IBS/CBS.

Impacto prático:

Serviços como abertura, manutenção e encerramento de conta corrente continuarão tributados como serviços comuns. Já avaliação de crédito, análise de garantias e emissão de boletos entram no regime específico.

2.3. Alíquotas e carga tributária mantida

“...a maioria dos serviços financeiros terá uma alíquota nacionalmente uniforme, calibrada para manter a carga atual...”
(Bernardo Appy)

A alíquota aplicável será uniforme em todo o país, fixada por lei, de modo a preservar a carga tributária atual durante o período de transição (2027–2032). A alíquota só poderá ser revista após 5 anos, mediante lei complementar.

Comentário técnico:

O modelo visa neutralidade fiscal, evitando aumento imediato de carga. Hoje, bancos recolhem PIS/Cofins de 4,65 % sobre o spread, mas sem direito a crédito nas aquisições (sistema cumulativo).
Na reforma, a alíquota efetiva será ajustada para produzir mesmo efeito arrecadatório, só que com direito a crédito, tornando o sistema não cumulativo real.



2.4. Base de cálculo — a “margem financeira”

“...a base de cálculo é o spread deduzidas as provisões para créditos de liquidação duvidosa...”


A base é a receita de intermediação financeira (spread), deduzidas:
  • provisões para perdas com crédito (PCLD);
  • receitas isentas ou alíquota zero;
  • reversões de provisões, quando ocorrerem, voltam à base.

Comentário técnico:

A inovação é permitir a dedução das provisões — algo que não existia no PIS/Cofins — refletindo melhor o lucro real das instituições financeiras.
➡️ Quando a provisão é revertida (crédito recuperado), retorna à base de cálculo, preservando simetria.

2.5. Exemplo prático: crédito bancário e crédito do tomador

“...empresa que tomou o crédito terá direito a crédito de IBS/CBS em cada parcela, descontando o principal e a Selic, aplicando sobre o spread...”
(Appy)

Portanto:

  • O tomador de operação de crédito pode aproveitar crédito de IBS/CBS com base no spread financeiro.
  • O crédito só pode ser apropriado após o pagamento do tributo pela instituição financeira.

Exemplo de cálculo:

Parcela

Valor total

Principal

Juros Selic

Spread implícito

Base de crédito IBS/CBS

100

100

80

10

10

crédito sobre 10 × alíquota do regime


Impacto prático:

Empresas que tomam crédito de giro ou financiamento de equipamentos poderão registrar crédito de IBS/CBS sobre o spread, reduzindo custo financeiro líquido.
➡️ Mas o crédito só é permitido se o banco efetivamente recolher o tributo (seguindo a lógica de “tributo pago → crédito concedido”).

2.6. Casos de alíquota zero

“...se eu tenho uma debênture de emissão pública, aplica-se alíquota zero, porque não há crédito para o emissor...” ()

 Assim:

  • Operações com títulos de emissão pública têm alíquota zero, pois o emissor não gera direito a crédito.

Comentário técnico:

Isso evita distorções em instrumentos de captação pública (como debêntures, Letras Financeiras etc.), garantindo neutralidade entre o mercado de crédito e o de títulos.

2.7. Operações entre instituições financeiras

“...instituição financeira tomou crédito com outra... deduz da base de cálculo, mas não gera crédito...”

Assim:

Quando o tomador também é instituição financeira, não há crédito, apenas dedução da base de cálculo.
Isso evita dupla apropriação e perda de arrecadação global, mantendo coerência com o princípio da não cumulatividade controlada.

2.8. Fundos de investimento e gestão de recursos (arts. 207 e 221 da LC 214/2025)

“...os artigos 207 e 221 falam da gestão e administração de recursos... o fundo em si não é contribuinte, mas há tributação do gestor.” (Barreirinhas e Appy)

Base legal:

  • Art. 207: O gestor ou administrador do fundo é o contribuinte pelo IBS/CBS.
  • Art. 221: Os fundos de investimento não são contribuintes (não geram créditos nem débitos).

Comentário técnico:

Evita bitributação: o fundo não recolhe o imposto, apenas o gestor, sobre sua remuneração (taxa de administração/performance).
Para empresas que investem em fundos (por ex., aplicações de caixa de supermercados), não há crédito de IBS/CBS — mantém neutralidade entre aplicar em fundos ou em títulos diretos.

2.9. Fundos de Investimento e o Art. 208 da LC 214/2024

  • O fundo em si não é contribuinte do IBS/CBS.
  • A tributação recai sobre os serviços contratados pelo fundo, como:
    • Gestão e administração: seguem a alíquota de serviços financeiros, sem direito a crédito.
    • Serviços não financeiros (ex.: contabilidade): seguem as regras gerais de IBS/CBS, com eventual redução de 30% na alíquota (profissionais liberais).
Conclusão: a tributação do fundo é definitiva, sem crédito, porque o fundo não é contribuinte.
Exceção mínima — irrelevante economicamente — quando o serviço é adquirido de prestadores não financeiros.

3. FGTS e Fundos Garantidores (com Roni)

  • Operações financiadas pelo FGTS têm alíquota zero de IBS/CBS, mantendo o tratamento atual (isenção de PIS/Cofins).
  • As instituições financeiras intermediárias (operadores) têm manutenção da carga tributária atual, que é mínima.
  • Fundos garantidores e financiadores de políticas públicas instituídos em lei também têm alíquota zero, por sua função social.

4. Arranjos de Pagamento e Antecipação de Recebíveis (Marcos Flores)

  • Incluídos no regime específico de serviços financeiros.
  • Base de cálculo: tarifas, comissões e aluguéis de equipamentos (ex.: maquininhas).
  • Antecipação de recebíveis:
    • Tratada como operação de crédito, mas usando a taxa DI (Depósito Interfinanceiro) em vez da Selic.
    • A base tributável é a diferença entre o desconto aplicado e a taxa básica (DI) correspondente ao prazo.
    • A empresa que antecipa pode tomar crédito, aplicando-se a mesma lógica do crédito financeiro comum.

5. Bolsas, Mercados Organizados e Entidades Depositárias

  • Comissões e tarifas cobradas por bolsas de valores, depositárias centrais e mercados organizados são tributadas pelo regime de serviços financeiros.
  • Tomador contribuinte (empresa): tem direito a crédito de IBS/CBS.
  • Operações são simples e seguem a lógica da não cumulatividade.

6. Seguros, Resseguros, Previdência e Capitalização

  • Regime não cumulativo, com base de cálculo ajustada:
    • Base = Prêmio + Rentabilidade das reservas – Sinistros pagos
  • Seguros contratados por empresas → crédito para o tomador;
  • por pessoas físicas → tributação definitiva.
  • Sinistros pagos → não geram débito nem crédito (neutralidade via alíquota zero).
  • Previdência complementar → sem crédito, pois o tomador é pessoa física.
  • Resseguro e retrocessãoalíquota zero, para simplificação e evitar dupla tributação.


7. Ativos Virtuais (art. 229)

  • Serviços prestados por exchanges e plataformas de criptoativos → sujeitos ao regime específico de serviços financeiros.
  • Uso de ativos virtuais como meio de pagamento → segue o regime da operação principal (normas gerais).
    • Exemplo:
      • Se a compra de um bem é tributada normalmente, o fato de o pagamento ser feito com cripto não altera o tratamento.
  • Art. 229, §2º: reforça que o pagamento em ativos virtuais não muda o regime tributário, apenas a mecânica de apuração.



8. Comentários técnicos e jurídicos

8.1. A “grande inovação” da não cumulatividade no setor financeiro

Comentário:

Bernardo Appy e Roni Peterson destacam a inovação estrutural trazida pela Reforma: pela primeira vez, os serviços financeiros — historicamente tributados de forma cumulativa (PIS/Cofins) — passam a se inserir num modelo de não cumulatividade.

Isso significa:

  • As instituições financeiras passam a ter direito a créditos de IBS e CBS (como outros contribuintes do IVA).
  • O tomador de serviços financeiros (ex.: empresas que pagam tarifas bancárias) também passa a poder se creditar desses tributos.

8.2. Distribuição da arrecadação – Critérios específicos

Comentário:

Como a arrecadação do IBS é estadual e municipal, e o setor financeiro tem operações sem localização física clara, a lei prevê critérios de rateio:

  • Crédito e financiamento: distribuição conforme participação populacional e econômica dos entes;
  • Fundos de investimento: conforme a participação dos cotistas domiciliados em cada Estado/Município;
  • Seguros e previdência: conforme local de residência do tomador.

Essas informações virão da declaração eletrônica das instituições, garantindo transparência e rastreabilidade.

8.3. Declaração específica das instituições financeiras (nova obrigação acessória)

Comentário:

As instituições financeiras terão de entregar uma declaração própria, semelhante à DCTFWeb ou à antiga DES-IF (Declaração de Serviços de Instituições Financeiras).

Essa nova declaração — chamada “Declaração de Regimes Específicos (DERE)” — servirá para:

  • Detalhar a base de cálculo por tipo de operação (ex.: crédito, câmbio, seguros, investimentos);
  • Informar a margem tributável de cada operação (spread, prêmio, comissão etc.);
  • Permitir à Receita Federal e ao Comitê Gestor do IBS distribuir a arrecadação entre Estados e Municípios.

8.4. Integração com sistemas já existentes (DES-IF → DERE)

Comentário:

O coordenador Marcos Flores destaca que o novo sistema vai reaproveitar estruturas já usadas pelo Banco Central, Susep e ANS, como:

  • Plano de Contas Cosif (Bacen)
  • Plano Contábil da Susep (para seguradoras)
  • Plano da ANS (para operadoras de saúde)

Ou seja:
➡️ Sem revolução de sistemas, apenas uma adaptação da base de dados para apurar a margem tributável e os créditos de cada tomador.

8.5. Impacto para o contribuinte pessoa física – Nenhuma mudança prática

Contexto:

A fala final de Roni, Barreirinhas e Appy reforça o princípio de neutralidade econômica e administrativa da Reforma.

Comentário:

Para o consumidor final ou pessoa física, nada muda:

  • As tarifas, juros e produtos financeiros seguem sendo contratados da mesma forma;
  • Não há nova obrigação nem alteração de rotina;
  • A complexidade fica concentrada na Receita Federal e nas instituições financeiras, que passam a detalhar eletronicamente suas margens e créditos.

👉 O objetivo é que o sistema seja invisível para o cidadão, mas mais transparente e equilibrado para as empresas.

Sem mais.


Nota metodológica

A extração, organização e interpretação dos dados apresentados neste material foram realizadas com o apoio de Inteligência Artificial, utilizando as ferramentas ChatGPT e NoteGPT, que permitiram o processamento automatizado e a análise contextual do conteúdo original, garantindo precisão e fidelidade às informações.

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