Introdução
A Reforma Tributária, que está em processo de regulamentação no Brasil, criou um novo desenho de tributação do consumo — com a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) e o Imposto Seletivo (IS). Um ponto central e sensível na operacionalização dessas novas normas é a definição de “bens essenciais”: quais produtos terão alíquota zero ou regimes de redução e por quê. Este artigo explica, de forma prática, o que se entende por bem essencial no contexto da reforma, quais critérios devem orientar essa classificação e quais são os impactos mais relevantes para supermercados e atacarejos.
Por que a definição importa?
A classificação de um produto como “essencial” determina tratamento tributário preferencial (alíquota zero ou reduzida) e, portanto, afeta preço ao consumidor, margem de varejistas e arrecadação pública. Além disso, define mecanismos de compensação de créditos tributários nas cadeias de consumo — crucial para setores com margens apertadas, como supermercados.
Definição proposta (operacional)
Bem essencial — para efeitos práticos da Reforma Tributária (CBS/IBS) — é aquele produto ou serviço que, por sua natureza e função, é necessário para a garantia de direitos fundamentais (alimentação, saúde e higiene básica) e para a manutenção do padrão mínimo de bem-estar da população, segundo critérios objetivos de saúde pública, segurança alimentar e relevância social.
Em termos práticos, inclui:
- alimentos da Cesta Básica Nacional (itens in natura ou minimamente processados que garantem segurança alimentar);
- medicamentos essenciais e insumos farmacêuticos críticos à saúde pública (quando explicitamente previstos);
- itens de higiene e limpeza considerados fundamentais para saúde pública (quando enumerados por norma).
Critérios objetivos para classificar um bem como “essencial”
Recomenda-se aplicar um conjunto de critérios cumulativos e verificáveis:
- Necessidade básica / segurança alimentar — o produto integra listas oficiais de cesta básica ou políticas públicas de segurança alimentar.
- Natureza do produto — in natura ou minimamente processado (não transformações industriais que adicionem valor significativo).
- Impacto na saúde pública — remédios e insumos fundamentais para tratamento de doenças prioritárias.
- Relevância social e cultural — itens de reconhecida relevância regional que atendem hábitos alimentares essenciais (ex.: erva-mate em regiões onde é base cultural) — quando previsto expressamente em norma.
- Compatibilidade com políticas sociais — inclusão em listas oficiais usadas por programas sociais/assistência (ex.: cesta básica do MDS).
Fontes normativas e precedentes técnicos
- A regulamentação da Reforma (Lei Complementar que institui CBS/IBS) prevê listas e critérios para isenções e reduções, tornando necessário apoio técnico para interpretação.
- A formação da “Cesta Básica Nacional” e decretos do MDS dão base técnica para a lista de alimentos essenciais.
- Soluções de consulta e precedentes sobre “essencialidade” (ex.: interpretações sobre insumos para PIS/Cofins) mostram que o critério da essencialidade costuma ser aplicado de forma casuística e exige documentação técnica para justificar créditos ou isenções.
Exemplos práticos (lista indicativa)
- Provavelmente essenciais (alíquota zero): arroz, feijão, leite, pão comum, óleo vegetal (tipos definidos), açúcar, massas básicas, frutas, verduras, ovos.
- Possivelmente com redução (alíquota reduzida): medicamentos essenciais, serviços de saúde essenciais, alguns insumos agropecuários.
- Fora do conceito (tributação integral): alimentos ultraprocessados com finalidades não nutritivas (ex.: salgadinhos, refrigerantes), refeições prontas industrializadas, itens de conveniência premium.
- Observação: listas definitivas dependem de regulamento e podem incluir exceções regionais ou produtos parcialmente isentos (ex.: produtos minimamente processados mantidos isentos enquanto não se considerar “industrialização”).
Recomendações práticas (para times Fiscais e de Operações)
- Mapear o portfólio por NCM e cruzar com lista oficial da Cesta Básica e regulamentos da LC/PLP.
- Documentar justificativas técnicas para classificação de itens — retenha políticas públicas, notas técnicas ou laudos que mesmos embasem eventual fiscalização.
- Atualizar módulos de ERP e EFD para novos campos IBS/CBS imediatamente (2026: campos tornam-se obrigatórios).
Conclusão
“Bem essencial” na Reforma Tributária é um conceito jurídico-técnico, que precisa ser operacionalizado com critérios objetivos (segurança alimentar, natureza do processamento, impacto em saúde pública e inclusão em listas oficiais). A definição final será normativa — entretanto, para o varejo supermercadista a preparação (mapeamento de portfólio, ajustes de sistemas e documentação) é indispensável para capturar benefícios e evitar riscos fiscais.


0 Comentários