Ementa
ICMS – Diferimento – Regime Especial Simplificado de Exportação – Industrialização em estabelecimento de terceiro.
I. É aplicável o diferimento previsto no artigo 450-B do RICMS/2000 na aquisição, por contribuinte que possua o Regime Especial Simplificado de Exportação (RESE,) de insumos que serão remetidos para industrialização em estabelecimento de terceiro, quando a mercadoria resultante do processo de industrialização for exportada pelo próprio autor da encomenda.
II. Não poderão ser adquiridos, ao amparo desse regime, materiais secundários - aqueles que se consomem no processo de industrialização, não integrando o novo produto.
III. Os materiais que não integram os produtos resultantes do processo fabril, nem nele se consomem, ainda que empregados para garantir a qualidade ou mesmo a própria consecução do processo produtivo, não correspondem ao conceito de insumos de que trata a Decisão Normativa CAT-1/2001, razão pela qual não há direito a crédito pelo ICMS pago quando de sua aquisição.
Relato
1. A Consulente, cuja atividade econômica principal declarada no Cadastro de Contribuintes do Estado de São Paulo – CADESP é a “fabricação de artefatos de material plástico para outros usos não especificados anteriormente” (CNAE 22.29-3/99), informa que realiza industrialização por conta de terceiros, em que recebe a matéria-prima a ser industrializada, exceto materiais secundários e de embalagem.
2. Acrescenta que seu cliente, também estabelecido no Estado de São Paulo, é do ramo aeronáutico e seus principais produtos industrializados são partes e peças de aeronave classificadas na NCM 8807.30.00. Adicionalmente, informa que tanto o autor da encomenda quanto o industrializador possuem Regime Especial Simplificado de Exportação (RESE), que dispõe que as saídas de materiais aplicados (adquiridos pelo industrializador) no processo de industrialização se dão com diferimento do ICMS.
3. Cita a Decisão Normativa CAT 01/2001 que dispõe sobre o direito ao crédito do valor do imposto destacado em documento fiscal referente a aquisição de insumos, ativo imobilizado, energia elétrica, serviços de transporte e de comunicação, combustível e materiais para uso ou consumo, entre outras mercadorias. Desse modo, questiona se, considerando o RESE, há direito ao crédito relativo aos materiais secundários e de embalagem aplicados no processo de industrialização por conta de terceiros, tais como, tais como: lixa disco (NCM 6805.20.00), faca lectra (NCM 8208.90.00), rolo de lã sintética (NCM 9603.40.10), fita crepe (NCM 4811.41.10), entre outros.
Interpretação
4. Preliminarmente, registramos que a presente resposta adotará como premissa que o cliente da Consulente (autor da encomenda) adquirirá matéria-prima, produto intermediário ou material de embalagem, de fornecedor paulista e os remeterá, nos termos dos artigos 402 e seguintes do RICMS/2000, ao estabelecimento industrializador (Consulente), também paulista, para fabricação de mercadoria; e que a mercadoria resultante do processo de industrialização será exportada pelo autor da encomenda (cliente).
5. Com efeito, na acepção clássica do instituto da industrialização por conta de terceiro, visualizou-se a situação em que o autor da encomenda fornece todas - ou, senão, ao menos, as principais - matérias-primas empregadas na industrialização, enquanto ao industrializador cabe o fornecimento essencialmente da mão de obra, apenas com eventual acréscimo de insumos, de forma secundária. E essa é a hipótese normatizada pelos artigos 402 e seguintes do RICMS/2000.
5.1. Sendo assim, no instituto da industrialização por conta de terceiro, criou-se uma ficção legal, aproximando-se o autor da encomenda da industrialização e tratando-o como industrializador legal para fins do ICMS, de modo que tudo se passa como se a industrialização fosse feita pelo próprio autor da encomenda, isto é, como se ele adquirisse as mercadorias empregadas no processo de industrialização e se creditasse do respectivo imposto.
6. Desse modo, o fato de a mercadoria a ser exportada pelo autor da encomenda ser fabricada por estabelecimento industrializador paulista com insumos (indispensavelmente matérias-primas) remetidos por ele (e adquiridos de fornecedores paulistas), nos termos da sistemática preconizada pelos artigos 402 e seguintes do RICMS/2000, não impede a adoção do regime especial simplificado de exportação, previsto nos artigos 450-A a 450-I do RICMS/2000, com aplicação disciplinada pela Portaria CAT 31/2005 e alterações, desde que atendidas as exigências dispostas nessa legislação.
6.1. Cabe enfatizar, contudo, que, por falta de previsão legal, não poderão ser adquiridos, ao amparo desse regime, materiais secundários, que são aqueles que se consomem no processo de industrialização, não integrando o novo produto, conforme artigo 450-B do RICMS/2000.
7. Nesse sentido, na saída do produto acabado do industrializador (Consulente) em retorno ao estabelecimento autor da encomenda, detentor do RESE, deverá ser emitida uma única Nota Fiscal, na forma prevista no artigo 404 do RICMS/2000, na qual deverão constar os seguintes códigos, conforme disposto no artigo 127, § 19, do RICMS/2000:
7.1. o CFOP 5.902 (retorno de mercadoria utilizada na industrialização) ou o CFOP 5.925 (retorno de mercadoria recebida para industrialização por conta e ordem do adquirente da mercadoria, quando aquela não transitar pelo estabelecimento do adquirente), para o retorno dos insumos recebidos para industrialização e incorporados ao produto;
7.2. o CFOP 5.903 (retorno de mercadoria recebida para industrialização e não aplicada no referido processo) para o retorno dos insumos recebidos pelo industrializador diretamente do autor da encomenda, porém não aplicados no processo de industrialização, quando for o caso;
7.3. o CFOP 5.949 (outra saída de mercadoria não especificada) para discriminar eventuais perdas não inerentes ao processo produtivo; e
7.4. o CFOP 5.124 (industrialização efetuada para outra empresa) ou CFOP 5.125 (industrialização efetuada para outra empresa quando a mercadoria recebida para utilização no processo de industrialização não transitar pelo estabelecimento adquirente da mercadoria), nas linhas correspondentes aos serviços prestados (mão de obra) e aos materiais de propriedade do industrializador empregados no processo industrial, como detalhado a seguir:
7.4.1. para a mão de obra aplicada, deverá ser utilizado o código NCM “00000000” (oito zeros) e o CST 51 (diferimento), se for aplicável a disciplina prevista na Portaria CAT 22/2007, ou CST 00 (tributada integralmente), caso contrário;
7.4.2. para os insumos de propriedade do industrializador empregados no processo industrial, incluindo energia elétrica e combustíveis, o código NCM correspondente a cada um deles e o CST correspondente à tributação de cada insumo utilizado. Reitera-se que o diferimento previsto no artigo 450-B do RICMS/2000, aplica-se a matéria-prima, produto intermediário e material de embalagem, não abrangendo materiais secundários, que devem ser regularmente tributados. A discriminação dos produtos/insumos utilizados deverá ser feita separadamente da mão de obra, em linhas individualizadas.
8. Vale ressaltar que a operação de retorno, ao autor da encomenda, dos insumos de propriedade do industrializador empregados no processo industrial é tributada, seja em relação à matéria-prima, ao produto intermediário e ao material de embalagem, abrangidos pelo diferimento previsto no artigo 450-B do RICMS/2000, seja em relação aos materiais secundários, não abrangidos por tal diferimento. Desse modo, uma vez que a operação é tributada, a Consulente tem direito ao crédito em relação aos insumos empregados, quando for o caso, obedecidas as disposições legais. No entanto, conforme explicação a seguir, vale destacar que os insumos empregados pelo industrializador não se confundem com materiais de uso e consumo, de modo que estes não devem ser indicados na Nota Fiscal de que trata o item 7 e seus subitens, nem conferem ao industrializador, atualmente, qualquer direito a crédito.
9. Assim, neste ponto, faz-se necessário o detalhamento de vários conceitos, para avaliar a possibilidade de crédito relativo aos materiais mencionados no relato, tais como "lixa disco", "faca lectra", "rolo de lã sintética", "fita crepe", entre outros, que a Consulente entende serem materiais secundários e de embalagem. Contudo, uma vez que não há maiores detalhes sobre a utilização dos materiais objeto de questionamento, a presente consulta será respondida com considerações gerais sobre a matéria, sem validar os procedimentos já ou a serem adotados pela Consulente, cabendo a ela a adequação da presente resposta a sua realidade fática.
10. Prosseguindo, esta Consultoria Tributária tem tradicionalmente adotado os conceitos presentes na Decisão Normativa CAT 02/1982 para definir produto (ou material) intermediário e secundário, nos seguintes termos:
"1) Matéria-prima é, em geral, toda a substância com que se fabrica alguma cousa e da qual é obrigatoriamente parte integrante. Exemplos: o minério de ferro, na siderurgia, integrante do ferro-gusa; o calcário, na industrialização do cimento, parte integrante do novo produto cimento; o bambu ou o eucalipto, na indústria da autora, integrantes do novo produto – papel etc.
2) Produto Intermediário (assim denominado porque proveniente de indústria intermediária própria ou não) é aquele que compõe ou integra a estrutura físico-química do novo produto, via de regra sem sofrer qualquer alteração em sua estrutura intrínseca. Exemplos: pneumáticos na indústria automobilística e dobradiças, na marcenaria, compondo ambos os respectivos produtos novos (sem que sofram qualquer alteração em suas estruturas intrínsecas) – o automóvel e o mobiliário; a cola, ainda na marcenaria, que, muito embora alterada em sua estrutura intrínseca, vai integrar o novo produto – mobiliário.
3) Produto secundário é aquele que, consumido no processo de industrialização, não se integra no novo produto. Exemplos: calcário CaCo3 (que na indústria do cimento é matéria-prima), na siderurgia é "produto secundário", porquanto somente usado para extração das impurezas do minério de ferro, com as quais se transforma em escória e consome se no processo industrial sem integrar o novo produto: o ferro gusa; o óleo de linhaça, usado na cerâmica (para o melhor desprendimento da argila na prensa), depois de consumido na queima, não vai integrar o novo produto - telha; qualquer material líquido, usado na indústria da autora, que consumido na operação de secagem, deixa de integrar o novo produto - papel".
11. Desse modo, para caracterizar determinada mercadoria como insumo de produção (material secundário ou intermediário), não basta simplesmente constatar que ela é utilizada diretamente na atividade produtiva, pois há muitas mercadorias que também são utilizadas diretamente no processo produtivo, porém são classificadas como material de uso e consumo do estabelecimento (levando em conta o disposto no artigo 66, inciso V, do Regulamento do ICMS - RICMS/2000) ou bens do ativo imobilizado.
12. Nesse sentido, ressalte-se que a Decisão Normativa CAT 01/2001 estabeleceu as condições, limites, procedimentos e até mesmo certas cautelas que devem ser observados pelo contribuinte quando da apropriação, como crédito, do valor do ICMS destacado em documento fiscal referente à aquisição de insumos, ativo imobilizado, energia elétrica, serviços de transporte e de comunicação e combustível.
13. O subitem 3.1 da Decisão Normativa CAT 01/2001 (dentro do Capítulo III – Do Direito ao Crédito do Valor do Imposto) expõe o conceito de insumos que “são os ingredientes da produção, mas há quem limite a palavra aos 'produtos intermediários' que, não sendo matérias-primas, são empregados ou se consomem no processo de produção”. Nesse sentido, relaciona alguns exemplos, tais como: a matéria-prima, o material de embalagem, o combustível e a energia elétrica, consumidos no processo industrial ou empregados para integrar o produto objeto da atividade de industrialização.
13.1. O citado subitem 3.1 traz também, a título de exemplo, alguns insumos que se desintegram totalmente no processo produtivo de uma mercadoria ou são utilizados nesse mesmo processo produtivo para limpeza, identificação, desbaste, solda etc.: lixas; discos de corte; discos de lixa; eletrodos; oxigênio e acetileno; escovas de aço; estopa; materiais para uso em embalagens em geral - tais como etiquetas, fitas adesivas, fitas crepe, papéis de embrulho, sacolas, materiais de amarrar ou colar (barbantes, fitas, fitilhos, cordões e congêneres), lacres, isopor utilizado no isolamento e proteção dos produtos no interior das embalagens, e tinta, giz, pincel atômico e lápis para marcação de embalagens; óleos de corte; rebolos; modelos/matrizes de isopor utilizados pela indústria; produtos químicos utilizados no tratamento de água afluente e efluente e no controle de qualidade e de teste de insumos e de produtos.
14. Desse modo, verifica-se que, segundo o subitem 3.1 da Decisão Normativa CAT 01/2001, para ser classificado como insumo, determinado produto deve: (i) integrar o produto objeto da atividade de industrialização ou (ii) ser consumido de imediato no processo produtivo industrial.
15. Enfatizamos que não geram direito ao crédito as aquisições de materiais: (i) que se desgastam ao longo de processos produtivos, sendo que os mesmos devem ser substituídos, após certo tempo, porque perderam suas propriedades; e (ii) que compõem partes e peças do ativo imobilizado, ainda que relativas a maquinário de produção, quando da sua reposição periódica por desgaste ou quebra. Tais materiais são genericamente conhecidos como materiais para uso e consumo do próprio estabelecimento.
15.1. Exemplificando, materiais que são utilizados nas ferramentas e máquinas para seu funcionamento normal, e que são consumidos ao longo do tempo, ou as próprias ferramentas que integram os equipamentos e desgastam-se pelo seu próprio uso, ao longo do tempo, são materiais de uso e consumo.
16. Assim, no que se refere aos materiais objeto de questionamento, entendemos que aqueles que se consumirem de imediato durante o processo produtivo ou integrarem o produto cuja saída seja regularmente tributada, ainda que com imposto diferido, geram, por sua entrada ou aquisição, direito ao crédito pleiteado. Do contrário, tratar-se-á de de ativo imobilizado, caso esteja enquadrado nas disposições do Comitê de Pronunciamentos Contábeis (CPC) 27, ou de material de uso e consumo do estabelecimento, que, de acordo com o artigo 33, inciso I, da Lei Complementar 87/1996, na redação trazida pela Lei Complementar 171, de 27/12/2019, não confere direito a crédito atualmente.
17. Feitos esses esclarecimentos, consideramos sanadas as dúvidas apresentadas pela Consulente.
0 comments:
Postar um comentário